O englobamento das mais-valias dos investimentos especulativos no IRS dos contribuintes fará com que o último escalão perca, pelo menos, um quinto dos ganhos para impostos.
Segundo os cálculos da Deloitte, o englobamento das mais-valias dos investimentos especulativos no IRS dos contribuintes com rendimentos com 75.009 euros ou mais, previsto na proposta orçamental para 2022 e aplicável a partir de 2023, fará com que o último escalão perca, pelo menos, um quinto dos ganhos para impostos. Este regime está a criar reações aos agentes do mercado, avança esta terça-feira o Jornal de Negócios.
As simulações do impacto do novo regime de tributação de mais-valias mobiliárias foram elaboradas pela consultora, que concluiu que, num ganho de cinco mil euros, irão para impostos mais 1125 euros do que no ano anterior, conforme noticia o Jornal de negócios.
No caso dos 10 mil euros, o agravamento é de 2250 euros, enquanto em 100 mil euros poderá mesmo ser de 22 500 euros.
Para os cálculos, a Deloitte teve como padrão um contribuinte com um rendimento de anual de 92 mil euros, sem dependentes, e ponderou diversos valores de mais-valias decorrentes de venda de títulos mobiliários detidos por menos de 365 dias, a uma taxa de IRS sobre as mais-valias de 28%, revela a publicação.
A CEO da Euronext Lisbon, Isabel Ucha, destaca que "o englobamento das mais-valias em investimento em valores mobiliários, designadamente ações e obrigações, implica um agravamento da carga fiscal sobre o investimento na capitalização das empresas que recorrem ao mercado de capitais para se financiarem".
Octávio Viana, presidente da ATM - Associação de Investidores e Analistas Técnicos do Mercado de Capitais, é da opinião que o englobamento deveria manter-se opcional, visto que, além de servirem de "incentivo à evasão fiscal", "poderá haver casos em que a carga seja de tal forma, que leve a que os investidores optem por não investir nos produtos que realmente financiam a economia e optem por outros mais exóticos e suscetíveis de contornarem esses efeitos".
Já Carlos Rodrigues, presidente da direção da Maxyield - Clube dos Pequenos Acionistas, pondera também que não faz sentido retirar aos contribuintes que se encontrem no último escalão do IRS, sujeitos à taxa de 48%, a possibilidade de aplicar a taxa liberatória de 28%. A publicação ainda realça que "é abusivo considerar como especulativas, aplicações em valores mobiliários cujo período de detenção tenha como limite 365 dias".
A mesma fonte de notícias ainda revela que a medida já era esperada, visto que já tinha sido inscrita, e posteriormente chumbada, no anterior Orçamento do Estado, e já tinha "colhido críticas por parte da bolsa, de investidores, emitentes e associações representativas dos agentes no mercado financeiro". Apesar de o propósito do Governo ser promover uma "maior progressividade do IRS e justiça social", o mercado receia que uma tributação mais pesada possa penalizar ainda mais o papel da bolsa no financiamento da economia.
João Pratas, presidente da APFIPP - Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios firma que "apesar do previsto impacto orçamental limitado, já que só se aplica para mais-valias de ativos detidos por menos de um ano e apenas a contribuintes que se encontrem no último escalão de IRS", a medida "transmite uma mensagem contrária àquela que deveria estar idealmente a ser promovida".
"O Orçamento do Estado para o segundo semestre de 2022 não responde à necessidade estrutural de mais investimento e capital em Portugal, parece insuficiente na resposta à crise provocada pela agressão da Rússia sobre a Ucrânia, e também não contribui para assegurar a proteção dos níveis de emprego privado", remata Abel Sequeira Ferreira, diretor executivo da AEM - Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado.
Dado o contexto de recuperação económica de pós-pandemia, as várias fontes ouvidas pelo Negócios defendem que o Governo deveria promover o recurso das empresas ao mercado de capitais.